Sabe aquele hábito moderno de deitar à noite na cama e ligar o celular para ver o Facebook? Ou ligar a TV e ficar assistindo até dormir? Então... isso pode estar acabando com a sua saúde.
O artigo dessa semana testou o efeito de manter animais de laboratório expostos o tempo todo a luz artificial1. A ideia foi tentar simular o que muitas pessoas passam durante muito tempo de suas vidas. Profissionais que trabalham à noite, como seguranças e profissionais de saúde plantonistas em hospitais ficam expostos constantemente a luz durante o período de escuro. E isso parece que faz um mal enorme. Os animais expostos a luz constante tiveram uma desregulação clara do seu ciclo circadiano ou, em outras palavras, do seu relógio biológico. Isso foi acompanhado de um maior ganho de peso, perda de força muscular, perda de massa óssea (um início de osteoporose), anemia e um aumento de marcadores inflamatórios no sangue.
De fato, esse trabalho vem confirmar muitos outros estudos anteriores. Análises de profissionais plantonistas revelam, por exemplo, que esses profissionais tem maior incidência de câncer2, osteoporose3 e síndrome metabólica4. Além disso, animais de laboratório com ciclo circadiano desregulado não controlam seu apetite, engordam e desenvolvem diabetes5. Em face disso, você pensa: “ainda bem que eu não dou plantão”. Mas não se iluda, pessoas “normais”, expostas - como praticamente todos nós somos - a luz artificial prolongada, apresentam também menor qualidade do sono6, aumento de peso corporal7 e predisposição à doença cardíaca7.
Interessantemente, esse estudo vem semanas depois da publicação do mais recente e moderno mapa mundial de poluição luminosa8. Segundo esse mapeamento, mais de 80% dos seres humanos estão expostos a iluminação artificial prolongada, chegando ao incrível índice de 99 % da população dos Estados Unidos e da Europa. Ou seja, estamos colocando mais um vilão, pouco considerado, na nossa lista de “venenos da modernidade”. Além do estilo de vida menos ativo, os alimentos pouco nutritivos, a lista infinita de aditivos e compostos artificiais que ingerimos todos os dias, devemos agora nos preocupar também com o tempo que ficamos expostos a luz artificial.
Para não terminarmos de maneira amedrontadora e melancólica, a boa notícia é que os animais desse estudo tiveram seus parâmetros normalizados depois de passarem algum tempo em um ciclo claro/escuro padrão de 12 horas. Resta, para nós, portanto, desligarmos nossas luzes, celulares de TVs depois das 6 da tarde e só ligarmos novamente pela manhã... #sqn.
DICIONÁRIO
Ciclo circadiano: é o nosso “relógio biológico” e se refere à sincronização de processos biológicos (como a secreção de hormônios, período de atividade e sono) com o ciclo dia e noite de 24 horas. Para isso, os organismos usam vários parâmetros, sendo a incidência de luz o principal deles.
Anemia: diminuição no número de células vermelhas do sangue.
Osteoporose: diminuição da massa óssea, muito comum em mulheres, e que predispõe a fraturas.
Síndrome metabólica: conjunto de doenças que resultam da resistência a insulina (diabetes tipo II) e que aumentam o risco de doenças cardiovasculares como aterosclerose, derrame e infarto cardíaco. Clinicamente, é a presença, no mesmo indivíduo, de pelo menos três dos cinco critérios: obesidade, hipertensão, hiperglicemia, aumento de triglicerídeos e baixo HDL (bom colesterol).
REFERÊNCIAS
1. Lucassen et al., 2016. Environmental 24-hr cycles are essential for health. Curr Biol, in press (http://dx.doi.org/10.1016/j.cub.2016.05.038)
2. Stevens et al., 2014. Breast cancer and circadian disruption from electric lighting in the modern world. CA Cancer J Clin, 64: 207.
3. Quevedo & Zuniga, 2010. Low bone mineral density in rotating-shift workers. J Clin Densitom, 13: 467.
4. Pietroiusti et al, 2010. Incidence of metabolic syndrome among nightshift healthcare workers. Occup Environ Med, 67: 54.
5. Shi et al., 2013. Circadian disruption leads to insulin resistance and obesity. Curr Biol, 23: 372.
6. Obayashi et al., 2014. Effect of exposure to evening light on sleep initiation in the elderly: a longitudinal analysis for repeated measurements in home settings. Chronobiol Int, 31: 461.
7. Gangwisch, 2014. Invited commentary: nighttime light exposure as a risk factor for obesity through disruption of circadian and circannual rhythms. Am J Epidemiol, 180: 251.
8. Falchi et al., 2016. The new world atlas of artificial night sky brightness. Sci Adv, 2: e1600377.
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