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Mais um gene do infarto e do derrame

Fonte: revistavivasaude.uol.com.br

Eu já escrevi isso aqui: “os genes carregam a arma, mas o ambiente puxa o gatilho”. Ou seja, tanto os genes que recebemos dos nossos pais quanto o nosso estilo de vida têm influência sobre a maior parte das nossas características (incluindo as doenças metabólicas). Mas é importante descobrir genes que possam estar envolvidos com o surgimento de doenças e entender como eles funcionam, para que pessoas que os carregam possam ser avisadas tratadas de modo precoce. Isso pode evitar, ou pelo menos adiar, o aparecimento dos problemas. Como esse objetivo, pesquisadores do Reino Unido fizeram uma profunda busca na literatura científica e juntaram os resultados de dezenas de trabalhos publicados para verificar a relação entre um gene e o risco do desenvolvimento de infartos e AVCs (que no meu tempo se chamava derrame).

O gene em questão codifica a proteína glicoproteína IIIa (abreviada GPIIIa). Essa proteína possui diversas variantes, que podem ou não alterar a sua função no organismo. Uma variante (ou polimorfismo) comum é chamada PlA2, onde a proteína é diferente da original em apenas um aminoácido componente. Acredita-se que as pessoas que tem a variante PlA2 tenham níveis de ativação das plaquetas (importantes para a coagulação do sangue) maior que as que não carregam. Assim essas pessoas teriam maior chance que apresentar pequenos coágulos espontâneos pelo corpo, o que podem entupir pequenos vasos sanguíneos e causar derrames e infartos. Mas ainda não há consenso sobre essa hipótese.

De fato, os pesquisadores confirmaram que as pessoas que têm a variante PlA2 apresentam maior risco de ter um derrame. Mas apenas do tipo isquêmico (quando algum vaso sanguíneo no cérebro entope) e não do tipo hemorrágico (quando algum vaso se rompe). Quase 12 mil pessoas foram estudadas nesse caso. Para a análise de infartos, mais de 40 mil indivíduos foram estudados. Os cientistas também encontraram um risco maior de enfartar para as pessoas jovens que carregam a variante PlA2. Mas para as pessoas mais velhas, o risco não é maior, talvez devido a vários outros fatores que aparecem com a idade e aumentam o risco de doenças cardíacas. Os resultados foram publicados em dois artigos na revista PLoS ONE.

Referências

FLOYD, C. N.; ELLIS, B. H.; FERRO, A. The PlA1/A2 polymorphism of glycoprotein IIIa as a risk factor for stroke: a systematic review and meta-analysis. PloS one, v. 9, n. 7, p. e100239, 2014.

FLOYD, C. N.; MUSTAFA, A.; FERRO, A. The PlA1/A2 polymorphism of glycoprotein IIIa as a risk factor for myocardial infarction: a meta-analysis. PloS one, v. 9, n. 7, p. e101518, 2014.

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