Pode parecer óbvio, mas muita gente usa a falácia de apelo à natureza para justificar o uso de ervas medicinais ou outros produtos naturais, dizendo que já que é natural é bom. Gosto de contra argumentar dizendo que comigo-ninguém-pode e veneno de escorpião também são naturais, mas matam.
Nos últimos anos, houve um grande aumento do consumo de suplementos alimentares e fitoterápicos, e a indústria do setor bate recorde de lucros ano após ano. Estima-se que 6 % da população da cidade de São Paulo usa algum tipo de suplemento alimentar, mas esse número pode chegar a 50 % nos Estados Unidos. Muitas pessoas usam esses produtos sem orientação profissional com base no “é natural então é bom” ou “funcionou com meu colega de academia”, e nada pode ser mais perigoso que isso. Os levantamentos de dados mostram que de 2 % a 16 % dos casos de problemas no fígado causados por consumo de remédios ou outros compostos são devido ao uso de suplementos alimentares.
Parte dos problemas pode ser a forma como os produtos são registrados. Quando são registrados sob a forma de medicamento, eles são estritamente regulados e precisam mostrar que funcionam para o tratamento que propõem e que são seguros para o consumo. E depois de liberados, continuam sobre vigilância caso algo dê errado.
Resultado: os casos de problemas de saúde, principalmente no fígado, causados pelo uso de suplementos alimentares vem aumentando.
O chá verde é usado pelas pessoas pelas suas ações antioxidantes e de aceleração do metabolismo. O consumo desse chá é considerado seguro. Porém, também são vendidas cápsulas com extrato concentrado de Camellia sinensis (nome científico da planta de onde se faz o chá) e, assim, ela não parece ser tão segura. Foram relatados mais de 30 casos de danos no fígado causados pelo consumo do extrato de chá verde, incluindo uma morte e alguns transplantes. Não se sabe a causa dessa reação em algumas pessoas, mas parece que alguns componentes do extrato podem causar um estresse oxidativo e dano no fígado, especialmente durante um jejum prolongado. Um produto feito com 80 % de extrato da planta, contendo altas concentrações de cafeína e compostos chamados de polifenois chegou a ser retirado do mercado espanhol.
Outro suplemento alimentar muito consumido é a gordura chamada ômega 6, com a promessa de diminuir o peso e melhores os níveis de colesterol e triglicerídeos no sangue. Embora sejam raros, já foram descritos 3 casos de danos ao fígado causados pelo consumo excessivo de ômega 6. Uma pessoa teve que ser transplantada. E as outras duas melhoraram de saúde quando pararam de consumir as cápsulas.
Um suplemento menos famoso é o ácido úsnico, que é purificado de liquens, uma associação simbiótica de algas e fungos. O ácido úsnico é usado como um antibiótico natural e também para perda de peso, embora não existam provas científicas claras disso. Certo é que o ácido úsnico está associado a pelo menos sete casos de problemas no fígado. Um produto contendo a substância foi inclusive retirado do mercado americano.
Outros exemplos incluem o extrato chinês Ma Huang, feito com plantas do gênero Ephedra, que pode causar aumento de pressão, insônia e problemas intestinais (uso está proibido nos Estados Unidos), e extratos da fruta Garcinia cambogia (a fruta de emagrecimento das celebridades) que foram relacionadas a problemas no fígado.
Ok, então. Mas quanto mais vitamina, melhor, né? Também não. Os efeitos do excesso do consumo de vitaminas, chamados hipervitaminoses, são descritos há muito tempo. Por exemplo, o excesso de vitamina A pode causar cansaço, desconforto estomacal e anorexia, entre outras coisas.
O que tiramos disso tudo? Sempre use suplementos alimentares com acompanhamento profissional e aumente a frequência de visitas a um clínico geral para uma avaliação geral de saúde. Se por algum motivo, você tiver algum tipo de sensibilidade a qualquer composto do suplemento usado, é melhor descobrir rápido.
Referências
BRUNACIO, K. H. et al. Uso de suplementos dietéticos entre residentes do Município de São Paulo, Brasil. Cadernos de Saúde Pública, v. 29, n. 7, p. 1467–1472, 2013.
GARCÍA-CORTÉS, M. et al. Hepatotoxicity by Dietary Supplements: A Tabular Listing and Clinical Characteristics. International Journal of Molecular Sciences, v. 17, n. 4, p. 537, 2016.
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