Acho
que tudo mundo ouviu um discurso narrado Pedro Bial para a formatura de uma turma,
no qual ele começa recomendando o uso de filtro solar. Embora, na minha
opinião, a qualidade literária do texto seja duvidosa, eu não posso deixar de
concordar e também recomendar: usem filtro solar! Os filtros solares são a
forma mais eficiente de proteger a nossa pele dos raios ultravioletas do Sol,
especialmente em um país de grande extensão tropical, como o Brasil. A radiação
do Sol é um potente agente causador de alterações no DNA das células da nossa
pele. Se essas mutações no DNA não forem corrigidas pelos mecanismos que
existem nas células, elas vão se fixar no material genético e podem causar
diferentes mudanças no comportamento da célula. Entre elas, fazer com que as
células se multipliquem sem controle. Isso pode ser o início de um câncer. E,
embora as pessoas com pele clara estejam em maior risco de ter câncer de pele,
ele também atingem pessoas com pele escura; logo: filtro solar para todo mundo!
Existe
diferentes tipo de câncer de pele, mas o melanoma é o mais agressivo, causando
em torno de 50 mil mortes por ano no mundo. Um dos motivos para isso é o fato
dele ter uma grande capacidade de metástase, ou seja, das células do tumor se
espalharem para outros órgãos do corpo através da corrente sanguínea. Na maior
parte das vezes, os pacientes com câncer morrem devido à falência dos órgãos atacados
pela metástase. Hoje em dia, não existe uma terapia eficaz para prevenir a metástase
em pessoas com melanoma. Por isso, diferentes grupos de cientistas pelo mundo
estão estudando esse tipo de câncer, procurando novas formas de tratar o
melanoma. Entre eles, está o grupo do Dr. Sohail Tavazoie, da Rockefeller
University, nos Estados Unidos, que publicou, em Fevereiro desse ano, os resultados das suas pesquisas
mais recentes em um artigo na importante revista Cell.
Os
cientistas já sabiam que uma proteína produzida pelo corpo (chamada ApoE) era
capaz de impedir a metástase do melanoma. Agora, eles tentaram formas de
aumentar a produção dessa proteína. Para isso, eles trataram células de melanoma
em cultura com compostos que agem nas células mudando o seu metabolismo e as
proteínas que são produzidas. Eles viram que esses compostos não foram capazes
de matar ou impedir o crescimento das células, mas reduziram a capacidade do câncer
de invadir o meio onde ele era cultivado e de produzir vasos sanguíneos, que
são importantes para o crescimento do tumor, por levar oxigênio e nutrientes
até ele.
Com
esses resultados iniciais, os cientistas passaram para testes com camundongos. Os
compostos estudados reduziram o crescimento de tumores pequenos e grandes, além
de aumentar a sobrevida dos animais. Eles também reduziram a proliferação das
células tumorais e quantidade de vasos sanguíneos que chegavam até o melanoma.
E o mais interessante: os compostos reduziram a metástase dos tumores para o
pulmão e cérebro dos camundongos.
A
próxima pergunta era óbvia: como isso acontece? A pesquisa descobriu que os
compostos usados aumentavam a produção da proteína ApoE nas células cancerígenas
e que ela era a responsável pelos efeitos observados. Mas a produção de ApoE no
camundongo como um todo também aumentou e isso era o mais importante para
bloquear o crescimento do melanoma e sua metástase. Os cientistas também
observaram que esses compostos também agiam sobre melanomas resistentes ao
tratamento com os quimioterápicos normalmente usados e que quando eles eram
usados juntos com os remédios já conhecidos, o tratamento se tornava mais
eficiente.
Por
último, analisando pacientes humanos, o grupo descobriu que pessoas com menores
níveis da proteína ApoE apresentam maior taxa de metástase e menor expectativa
de vida, o que mostra uma relação direta entre a ApoE e a agressividade do
melanoma.
O
que é mais legal: os compostos que os cientistas usaram eram, na verdade,
remédios desenvolvidos para tratar pessoas com dislipidemia, ou seja, gente
(como eu) que tem colesterol e triglicerídeos altos no sangue. Dessa forma, os
cientistas encontraram novos alvos para atacar o câncer e já têm uma arma
desenvolvida. Isso irá facilitar os novos testes em animais e com humanos, o
que pode acelerar o processo de aprovação de um novo remédio para tratar o câncer
de pele.
Mas
lembre-se de continuar usando filtro solar!
Referência
PENCHEVA, N.;
BUSS, C. G.; POSADA, J.; MERGHOUB, T.; TAVAZOIE, S. F. Broad-spectrum
therapeutic suppression of metastatic melanoma through nuclear hormone receptor
activation. Cell, v. 156, n. 5, p.
986-1001, 2014.
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