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Fonte: oglobo.globo.com |
A malária é hoje a doença infecciosa que mais mata no mundo; ela mata mais que a AIDS e a tuberculose. Cerca de 700 mil pessoas morrem todos os anos em decorrência da doença, principalmente crianças africanas. A conta é simples: uma criança africana morre de malária por minuto! Porém, a malária deveria ser mais fácil de controlar do que a AIDS e a tuberculose. Enquanto as duas últimas são transmitidas de pessoa para pessoa, a malária é obrigatoriamente transmitida por mosquitos. Isso cria dois pontos para enfrentar a doença: o parasita em si e o mosquito. Mas estamos perdendo a batalha. Os medicamentos para combater a doença são antigos e pouco eficientes. E os mosquitos estão cada vez mais resistentes aos inseticidas usados e outros métodos de controle. É urgente que novas formas sejam desenvolvidas.
Nesse ponto, a engenharia genética pode dar uma mão, através da criação de mosquitos transgênicos. Diferentes grupos de pesquisas pelo mundo têm tentado criar mosquitos em laboratório com variados recursos para combater a malária. Entre eles, mosquitos incapazes de transmitir o parasita, mosquitos que morrem quando são infectados ou mosquitos que não se reproduzem. Recentemente, cientistas da Europa publicaram na revista Nature Communications uma nova estratégia: um mosquito macho que só tem filhotes machos.
O sistema de definição de sexo desse mosquito é semelhante ao nosso. O inseto possui um par de cromossomos sexuais (X ou Y): se o indivíduo tem dois cromossomos X, ele é um mosquito fêmea; se ele tem um X e um Y, é macho. Quando as células reprodutoras (ou seja, o ovo da fêmea e os espermatozoides do macho) são formadas, esse par de cromossomos se separa. Todos os ovos têm um cromossomo X, porque a fêmea possui apenas cromossomos X. Já os espermatozoides dos machos são metade X e metade Y. Assim, se um ovo for fecundado por um espermatozoide X, ele vai gerar uma fêmea (XX); se o espermatozoide for Y, o novo mosquito será macho (XY). O que os pesquisadores queriam era alterar esse balanço entre machos e fêmea gerados.
Os pesquisadores já sabiam que o mosquito tem uma enzima que degrada DNA, mas especificamente em regiões no cromossomo X do mosquito. Quando essa enzima era produzida pelos espermatozoides, os com cromossomo Y ficavam de boa na lagoa, porém os com cromossomo X tinham o DNA degrado e morriam. Ou seja, esse mosquito só geraria larvinhas meninos. Mas tinha um problema: a enzima era tão duradora que ela continuava atuando depois da fecundação e degradava também o cromossomo X do ovo. Assim, ela matava também o embrião. Resultado: o mosquito era estéril.
Isso até é legal, pois permitiria a redução da população de mosquitos, já que muitas fêmeas não gerariam novas larvas. Porém, a liberação desses mosquitos transgênicos teria que ser uma rotina. Depois que os da primeira leva morressem, a população voltaria a crescer e novos mosquitos transgênicos teriam que ser produzidos e liberados. Não é uma solução definitiva.
O que os cientistas fizeram então foi modificar a estrutura da enzima, para deixá-la menos eficiente. Eles mudaram algumas letras do gene que produz a enzima, alterando a sua constituição. Com uma estrutura diferente e mais frágil, ela continuava degradando o cromossomo X, porém sua atividade diminuía muito mais rápido que a original. Assim, os pesquisadores esperavam que ela matasse os espermatozoides com cromossomo X, mas não o embrião gerado após a fecundação.
E funcionou! Os mosquitos que têm essa enzima modificada são tão férteis quanto os originais, mas de 70 % a 97 % dos seus filhotes são machos. Os mosquitos ainda não foram liberados na natureza, mas em experimentos em laboratório, em apenas cinco gerações, todos os mosquitos da população eram machos, não tinham mais com quem se reproduzir e morreram.
Essa também não é uma solução definitiva porque simplesmente acabar com uma espécie de mosquito não resolve. Outra espécie de mosquito irá ocupar o espaço da que foi eliminada, e umas 100 espécies de mosquitos pode transmitir malária. Mas essa nova estratégia pode ser combinada com outras para uma maior eficiência no combate à doença.
Referência
GALIZI, R.; DOYLE, L. A.; MENICHELLI, M.; BERNARDINI, F.; DEREDEC, A.; BURT, A.; STODDARD, B. L.; WINDBICHLER, N.; CRISANTI, A. A synthetic sex ratio distortion system for the control of the human malaria mosquito. Nature Communications, v. 5, p. 3977, 2014.
Nesse ponto, a engenharia genética pode dar uma mão, através da criação de mosquitos transgênicos. Diferentes grupos de pesquisas pelo mundo têm tentado criar mosquitos em laboratório com variados recursos para combater a malária. Entre eles, mosquitos incapazes de transmitir o parasita, mosquitos que morrem quando são infectados ou mosquitos que não se reproduzem. Recentemente, cientistas da Europa publicaram na revista Nature Communications uma nova estratégia: um mosquito macho que só tem filhotes machos.
O sistema de definição de sexo desse mosquito é semelhante ao nosso. O inseto possui um par de cromossomos sexuais (X ou Y): se o indivíduo tem dois cromossomos X, ele é um mosquito fêmea; se ele tem um X e um Y, é macho. Quando as células reprodutoras (ou seja, o ovo da fêmea e os espermatozoides do macho) são formadas, esse par de cromossomos se separa. Todos os ovos têm um cromossomo X, porque a fêmea possui apenas cromossomos X. Já os espermatozoides dos machos são metade X e metade Y. Assim, se um ovo for fecundado por um espermatozoide X, ele vai gerar uma fêmea (XX); se o espermatozoide for Y, o novo mosquito será macho (XY). O que os pesquisadores queriam era alterar esse balanço entre machos e fêmea gerados.
Os pesquisadores já sabiam que o mosquito tem uma enzima que degrada DNA, mas especificamente em regiões no cromossomo X do mosquito. Quando essa enzima era produzida pelos espermatozoides, os com cromossomo Y ficavam de boa na lagoa, porém os com cromossomo X tinham o DNA degrado e morriam. Ou seja, esse mosquito só geraria larvinhas meninos. Mas tinha um problema: a enzima era tão duradora que ela continuava atuando depois da fecundação e degradava também o cromossomo X do ovo. Assim, ela matava também o embrião. Resultado: o mosquito era estéril.
Isso até é legal, pois permitiria a redução da população de mosquitos, já que muitas fêmeas não gerariam novas larvas. Porém, a liberação desses mosquitos transgênicos teria que ser uma rotina. Depois que os da primeira leva morressem, a população voltaria a crescer e novos mosquitos transgênicos teriam que ser produzidos e liberados. Não é uma solução definitiva.
O que os cientistas fizeram então foi modificar a estrutura da enzima, para deixá-la menos eficiente. Eles mudaram algumas letras do gene que produz a enzima, alterando a sua constituição. Com uma estrutura diferente e mais frágil, ela continuava degradando o cromossomo X, porém sua atividade diminuía muito mais rápido que a original. Assim, os pesquisadores esperavam que ela matasse os espermatozoides com cromossomo X, mas não o embrião gerado após a fecundação.
E funcionou! Os mosquitos que têm essa enzima modificada são tão férteis quanto os originais, mas de 70 % a 97 % dos seus filhotes são machos. Os mosquitos ainda não foram liberados na natureza, mas em experimentos em laboratório, em apenas cinco gerações, todos os mosquitos da população eram machos, não tinham mais com quem se reproduzir e morreram.
Essa também não é uma solução definitiva porque simplesmente acabar com uma espécie de mosquito não resolve. Outra espécie de mosquito irá ocupar o espaço da que foi eliminada, e umas 100 espécies de mosquitos pode transmitir malária. Mas essa nova estratégia pode ser combinada com outras para uma maior eficiência no combate à doença.
Referência
GALIZI, R.; DOYLE, L. A.; MENICHELLI, M.; BERNARDINI, F.; DEREDEC, A.; BURT, A.; STODDARD, B. L.; WINDBICHLER, N.; CRISANTI, A. A synthetic sex ratio distortion system for the control of the human malaria mosquito. Nature Communications, v. 5, p. 3977, 2014.
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